segunda-feira, setembro 18, 2006

FESTA

Hoje é dia de festa na minha aldeia, longe do ruído doutros tempos, aguço a memória, lembro-me de como era concorrida, num dia como o de hoje eu não estaria fechado em casa, na época os motivos de diversão praticamente não existiam a nossa existência decorria com a monotonia própria do lugar, era nos dias da festa que se procurava encher o saco para todo o ano, era gente aos magotes vestida em tons alegres, a rivalidade entre terras era acesa, neste momento o gravador da minha mulher irrita-me com o som que debita, tenho vontade de o partir, por perturbar o meu silêncio, mas a vida é assim, ela gosta eu tenho que respeitar, coexistência pacifica, mas voltemos à festa que me remete para a infância, nunca fui um grande apreciador de estar só a ver, gostava mais de envolver-me com o que estava por detrás dela, sentia um prazer muito grande depois de vender uma rifa da tômbola, voltava para entregar o prémio ao vencedor, com isso procurava extorquir-lhe mais dinheiro para ele comprar outra, não me apercebia sequer qual seria o destino a dar ao lucro dos festejos, não me interessava, queria apenas andar de mesa em mesa a abordar as pessoas para elas comprarem, sentia um prazer muito grande.
O afastamento da aldeia numa idade muito tenra fez-me perder a ligação a coisas tão simples, anos mais tarde voltei, diz-se que um bom filho à casa torna, eu julgo-me um bom filho apesar da minha maneira de ser e estar, não sou perfeito, mas não desejo mal a ninguém, quando gosto manifesto-o, o contrário quantas vezes calo, para não magoar ficando eu magoado, alturas há em que penso, não me desculpam pelo facto de ter partido em busca de um futuro diferente do deles, mas por ele sacrifiquei muita coisa, senti na pele talvez como poucos a sensação de ser estrangeiro dentro e fora do seu espaço, quantas vezes chorei a minha solidão senti vontade de voltar, mas só o fiz quando a minha razão me aconselhou, lá fora ganhei força para enfrentar situações hostis, sem alardes vou reconquistar o meu lugar, sem esperar nada em troca, para já digo presente quando solicitado, não tomo a iniciativa de me oferecer, podem pensar que estou a impor-me, guardo-me para mim, é um acto egoísta, mas eu gosto de mim.